Mapeamento de casos relatados pela imprensa brasileira identificou 16 casos com 72 vítimas; mas relatos confirmados pela SaferNet mostram que há mais casos
A SaferNet Brasil identificou 16 casos de uso de deepfake sexuais em escolas de 10 dos 27 estados brasileiros. O mapeamento faz parte do estudo “Uso indevido de IA generativa: perspectivas sobre riscos e danos centradas nas crianças” que está sendo conduzido pela ONG brasileira sobre o mau uso de IA Generativa para o cometimento de crimes contra crianças e adolescentes. O estudo é financiado com recursos do fundo SafeOnline, gerido pela Unicef.
As deepfakes sexuais são imagens de nudez ou cunho sexual criadas com inteligência artificial generativa sem o consentimento das pessoas retratadas, caracterizando uma violação da privacidade e da dignidade.
A IA generativa é uma tecnologia que pode ser treinada com dados para a criação de novos conteúdos a partir de comandos humanos. Essas imagens podem ser inteiramente sintéticas, ou seja, criadas sem a imagem de uma criança real, ou podem ser manipuladas a partir de fotos e vídeos existentes para criar montagens hiper-realistas que alteram rostos e corpos (deepfakes).
Esse levantamento, conduzido de forma contínua pela SaferNet Brasil, analisando o noticiário sobre o tema desde 2023 até agora, identificou 16 casos de deepfakes sexuais envolvendo ao menos 72 vítimas nas cinco regiões do país. Os estados onde foram registrados casos são: Alagoas, Bahia, Mato Grosso, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Pernambuco, São Paulo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul.
Também foram identificados 57 agressores. Todos os envolvidos nos casos enumerados até agora tinham menos de 18 anos quando os atos aconteceram. Em quase todos os episódios noticiados pela imprensa, os crimes ocorreram em instituições de ensino privadas. As informações foram levantadas a partir da análise de centenas de reportagens publicadas por veículos nacionais e locais.
O número de casos pode ser bem maior pois a SaferNet recebeu informações e confirmou de forma independente mais três casos não noticiados pela imprensa: dois no Rio de Janeiro e um no Distrito Federal, com pelo menos mais 10 vítimas e um agressor identificados.
Embora o número de casos identificados até o momento seja menor em comparação às ocorrências de imagens de abuso e exploração sexual sem o uso de IA, chama a atenção o fato de não haver, por parte das autoridades brasileiras, um monitoramento sobre a incidência desses crimes, nem se as investigações sobre esses casos têm avançado, dificultando a compreensão da real dimensão do problema.
Sobre a pesquisa
Por conta dessa lacuna, a SaferNet iniciou a pesquisa para ouvir relatos de vítimas e testemunhas. Ao longo de mais de 18 anos acolhendo pessoas que passaram por esse tipo de violência, a SaferNet sabe que muitas vítimas não buscam ajuda, nem revelam estar sofrendo esse tipo de abuso, por medo do julgamento em seu grupo social ou familiar ou por acreditarem que nada será feito.
Por isso, todos os relatos poderão ser feitos de forma anônima e segura diretamente por meio do formulário https://bit.ly/pesquisadeepfake ou com a ajuda de profissionais de saúde mental do canal de ajuda da SaferNet. Sua voz pode nos ajudar a compreender a dimensão do problema e a proteger outras pessoas. Caso opte pelo Canal de Ajuda, ao iniciar seu relato, por e-mail ou chat, use as palavras-chaves “estudo de IA” para facilitar a identificação do seu relato.
“Sabemos que pode ser muito difícil falar sobre isso, mas a voz das vítimas é essencial para dimensionar o problema e ajudar outros adolescentes no futuro. Com a pesquisa, queremos elaborar um relatório inédito no Brasil sobre o tema e incentivar autoridades públicas a construir uma resposta a essa demanda com soluções que façam diferença no dia a dia dos adolescentes”, afirma Juliana Cunha, diretora de projetos especiais da SaferNet.
Segundo Juliana, a pesquisa também ajudará com recomendações sobre melhores abordagens nesses casos, inclusive medidas não restritivas de liberdade nos casos envolvendo adolescentes, para os quais são necessárias respostas que também os considerem como sujeitos em desenvolvimento.
Gráficos dinâmicos
Casos por estado:
Vítimas e agressores, por estado
O primeiro caso identificado no mapeamento data de 2023 — período em que as tecnologias de criação de imagens evoluíram de forma acelerada e se tornaram amplamente acessíveis.
Para a SaferNet Brasil, esse marco evidencia não apenas o caráter emergente dessas ferramentas, mas também a ausência de mecanismos públicos eficazes para monitorar seu uso.
Os registros existentes apontam um potencial elevado de danos psicológicos e sociais às vítimas, que ficam desprotegidas diante da dificuldade de responsabilização dos agressores e da rápida disseminação do conteúdo.
Legislação e regulamentação
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) define como crime, em seu artigo 241-C, a simulação de cenas de sexo ou cenas pornográficas com crianças e adolescentes.
Mesmo que o autor da manipulação seja menor de idade, o ato poderá ser enquadrado como ato infracional análogo ao crime previsto no artigo 241-C do ECA e punido com sanções de até três anos, como prevê o estatuto. Se o autor do crime for maior de 18 anos na data dos fatos, a pena prevista é de reclusão de três a seis anos, além de multa.
Caso você encontre algum conteúdo, artificial ou real, de imagens de abuso e exploração sexual infantil, denuncie à SaferNet na Central de Crimes Cibernéticos pelo link denuncie.org.br
Ambos os gráficos serão atualizados rotineiramente, com informações sobre estados, número de vítimas e agressores. No futuro, dados sobre gênero dos adolescentes envolvidos nas ocorrências poderão ser adicionados. Para sugerir uma alteração, entre em contato pelo e-mail: comunicacao@safernet.org.br.
Embora o Brasil tenha leis contra o abuso e a exploração sexual de crianças e adolescentes, o país ainda não possui regulamentação específica para a criação, distribuição ou comercialização de ferramentas de inteligência artificial.
Regulações dedicadas ao uso e ao desenvolvimento dessas tecnologias são relevantes para impedir, desde a concepção, futuros problemas de design e redistribuição no mercado consumidor.
Sobre a SaferNet Brasil
A Safernet completará 20 anos de existência em dezembro deste ano. Durante sua trajetória, a ONG brasileira tornou-se referência na promoção dos direitos humanos na internet. Com uma abordagem multissetorial, atua no enfrentamento aos crimes cibernéticos contra os Direitos Humanos, no acolhimento de vítimas de violência online e em programas de educação, prevenção e conscientização.
A Safernet mantém o Canal Nacional de Denúncias www.denuncie.org.br, conveniado ao Ministério Público Federal e o Canal de ajuda.org.br, o Helpline, para o acolhimento e orientação às vítimas de violência e outros problemas online. A Safernet promove o uso seguro da internet com projetos educacionais como a Disciplina de Cidadania Digital .
A SaferNet entrou este ano para o grupo dos hotlines que mais contribuíram globalmente para a detecção de páginas com material de abuso sexual infantil, a partir de denúncias e de busca pró-ativa com ferramentas de detecção, segundo o último relatório global do InHope, associação internacional que reune 57 canais de denúncia em 52 países.
Texto publicado em 06/10/2025
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Marcelo Oliveira
Assessor de Imprensa
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