SaferNet pesquisou sobre o tema com o uso da Lei de Acesso à Informação; três UFs não responderam
A SaferNet está lançando hoje (18/3) a versão completa do relatório “Cultura e Cidadania Digital nos currículos de Ensino Médio das redes estaduais de educação”, análise de um levantamento de informações feito com o uso da Lei de Acesso à Informação (LAI) e realizado junto às secretarias estaduais de Educação das 27 unidades da federação.
O objetivo do relatório é compreender como as redes de ensino têm incorporado, em suas matrizes curriculares de Ensino Médio, a competência de cultura digital da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e do complemento de Computação da BNCC considerando temas de uso seguro e consciente das tecnologias, além de formação continuada de professores.
24 das 27 UFs (89%) responderam ao levantamento da SaferNet, realizado com a colaboração da organização Fiquem Sabendo, entre os meses de fevereiro e julho de 2024. Não responderam os estados do Amapá, Pará e Piauí. Dessas 24 UFs, 19 (70%) possuem algum componente curricular (popularmente chamado de “matéria” ou “disciplina”) relacionado ao tema pesquisado.
O relatório apontou que 44% das redes estaduais possuem um componente curricular exclusivo sobre uso seguro e consciente de tecnologias. São 12 redes: Acre, Amazonas, Alagoas, Ceará, Paraíba, Pernambuco, Distrito Federal, Minas Gerais, Espírito Santo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Em outras 7 redes, a Safernet identificou componentes curriculares que abordam temas de uso consciente e seguro de tecnologias mesclados com outros temas. É o caso de Rondônia, Roraima, Maranhão, Sergipe, Rio de Janeiro, Mato Grosso e Tocantins.
“Nossa análise foi baseada nas ementas dos componentes curriculares informados pelas secretarias de educação em resposta ao levantamento. Estes documentos orientam e fundamentam o trabalho dos professores em sala de aula. Nos casos em que identificamos que existem componentes não exclusivos, isso significa que no mesmo componente curricular eram mencionados objetos de conhecimento específicos sobre uso seguro e consciente das tecnologias no âmbito da cultura digital, mas também outros temas, que poderiam ou não estar conectados à cultura digital”, explica Guilherme Alves, gerente de projetos da Safernet Brasil.
O Rio Grande do Norte informou que não possuía componente curricular sobre o tema e em São Paulo, a maior rede pública de ensino médio do país, a resposta da secretaria de educação foi de que havia um componente para ensino médio, que a análise da Safernet identificou que tratava de robótica e programação, sem menção a objetos de conhecimento específicos sobre uso seguro e consciente das tecnologias.
As 24 UFs que responderam à pesquisa da SaferNet informaram a existência de 73 componentes curriculares relacionados ao tema para o ensino médio. Desses 73, 40 componentes (55%) têm o tema do uso seguro e consciente das tecnologias presentes em suas ementas. Desses 40 componentes, 13 são eletivos e 11 são obrigatórios para segmentos do Ensino Médio — ou seja, não são ofertados para todos os estudantes.
A partir dos nomes desses componentes curriculares, a SaferNet montou uma nuvem de palavras e o termo que mais se repetiu foi “digital”, com 19 aparições, em seguida veio “cultura”, com seis, seguido de perto por “cidadania” e “tecnologia”, com cinco menções cada.
Dos 73 componentes listados, as redes de ensino mandaram à SaferNet 52 ementas (documento orientador do que será ensinado no componente). As redes do Mato Grosso do Sul, Tocantins e da Bahia não mandaram as ementas.
Acesse aqui a íntegra do relatório
Conclusões
Não há consenso sobre o que significa ensinar uso seguro e consciente de tecnologias para alunos de Ensino Médio no Brasil, pois existe uma multiplicidade de visões sobre o tema.
Essa multiplicidade se verifica no teor das ementas, que são amplas e não há uniformidade, por mais que a BNCC Computação indique habilidades específicas no eixo de cultura digital. Em algumas respostas, a SaferNet ainda detectou um foco em habilidades instrumentais da tecnologia, ou seja, ensinam sobre como usar as tecnologias, mas não sobre como fazer isso de forma segura e consciente.
Importante salientar que a falta de um componente curricular específico sobre uso seguro e consciente de tecnologias não descarta a possibilidade de outras abordagens pedagógicas, embora sua existência indique uma visão programática sobre a competência de cultura digital e sobre a importância de preparar estudantes para os desafios do uso seguro e consciente das tecnologias, inclusive transversalmente.
“O levantamento é também um retrato do que cada secretaria entende sobre o tema, uma vez que as análises foram baseadas integralmente na resposta dos órgãos e nos documentos enviados ou indicados por eles. Neste sentido, é importante salientar a necessidade de mais integração entre as redes de ensino, buscando um currículo mínimo sobre o uso seguro e consciente das tecnologias que chegue a todos os estudantes”, explica Guilherme Alves.
Recomendações da SaferNet Brasil
As matrizes curriculares dos estados e do distrito federal devem se adequar à BNCC, o que é desafiador, embora importante para garantir uma educação integral para os estudantes. A formação continuada dos educadores, desafio importante quando falamos de uso seguro e consciente das tecnologias, deve ser incentivada.
Devem ser criados repositórios públicos e abertos de ementas de componentes curriculares e devem ser incentivados canais de cooperação entre as diferentes redes de ensino, secretarias de Educação, professores e escolas públicas.
Uso de ementas flexíveis e adaptáveis que possam abranger todos os anos do Ensino Médio podem ajudar na efetivação do uso seguro e consciente das tecnologias nas escolas.
“As Diretrizes Curriculares Nacionais do Ensino Médio contemplando Educação Digital e Midiática, atualmente em desenvolvimento no Conselho Nacional de Educação, devem incluir orientações que colaborem na direção de uma visão compartilhada da Educação Digital e Midiática para a Cidadania Digital, trazendo intencionalidade pedagógica e política para o uso das TICs em prol da cidadania. É imprescindível que as redes de ensino sejam mais apoiadas neste processo de adaptação”, sugere Guilherme Alves.
Como foi feita a análise?
As análises foram feitas integralmente a partir das respostas à LAI. A SaferNet usou a LAI buscando dar integridade aos dados gerados.
Entretanto, a SaferNet não sugere o uso desse levantamento para uma comparação direta da situação entre as diferentes redes estaduais, mas sim como um mapeamento sobre a como cada secretaria entende a aplicação de componentes curriculares a respeito do uso seguro e consciente de tecnologias.
Isso se deve ao fato de que as respostas dadas pelas UFs dependem da interpretação dada às perguntas feitas pela SaferNet pelas pessoas envolvidas na elaboração das respostas, pela importância e comprometimento que os gestores envolvidos dão ao cumprimento da LAI, além dos riscos inerentes de as respostas estarem sujeitas à inconsistências e falhas nos registros.
Com as respostas em mãos, a SaferNet analisou o título e as ementas dos componentes curriculares e as propostas contidas na BNCC e na BNCC Computação.
Sobre a SaferNet
A Safernet existe desde 2005 e tornou-se a ONG brasileira de referência na promoção dos direitos humanos na internet. Com uma abordagem multissetorial, atua no combate a crimes cibernéticos contra os Direitos Humanos, no acolhimento de vítimas de violência online e em programas de educação, prevenção e conscientização. A Safernet mantém a Central Nacional de Denúncias, conveniada ao Ministério Público Federal e o Canal de Ajuda, o Helpline, para vítimas de violência e outros problemas online.
A Safernet também promove o uso seguro e consciente da internet com projetos educacionais como a Disciplina de Cidadania Digital, realizada em parceria com o Governo do Reino Unido, como parte do Digital Access Programme (DAP).
A Disciplina de Cidadania Digital é um programa completo de aulas que pode ser ministrado nos dois últimos anos do Ensino Fundamental e no Ensino Médio por educadores de qualquer disciplina. A disciplina pode ser usada em todo ou em parte e pode ser adaptada inclusive em situações de internet indisponível ou intermitente.
Em três anos, a disciplina já alcançou mais de 61 mil estudantes, e é aplicada por 535 professores, em 463 escolas de 23 UFs e em 321 municípios. O curso da disciplina para formação de educadores já alcançou quase 25 mil pessoas em todo o país.
Texto publicado em 17/03/2025
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Marcelo Oliveira
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